(Por Everton)
Uau! Chegamos na Índia!
Estar neste país foi algo tão chocante que não sei nem por onde começar os relatos... Vamos pelo começo, ou antes dele.
Estação de trem: Enquanto o sem-teto descansa no meio do saguão, a vaca também aproveita a sombra...
A preparação
Antes de virmos para cá, já tinhamos a idéia de que seria uma realidade completamente diferente do que estávamos acostumados. Ouvimos diversas vezes a frase: "Índia: ou você ama ou você odeia já nos primeiros minutos".
Conversamos com pessoas que disseram ter vindo em busca de experiencias espirituais e que tinham tido ótimas experiências. Já a outra grande maioria dos viajantes que já haviam passado por aqui, disseram para virmos preparados, pois sentiríamos um impacto.
Eu já sabia que a comida seria um fator complicante, por conta da minha alergia à pimenta e comidas muito condimentadas. Sim, eu sobrevivi à todo o Sudeste Asiático, conseguindo me esquivar dos inúmeros tipos de "Chili" e outras coisas picantes, mas eu já havia lido que aqui seria diferente, pois os molhos que eles geralmente usam na comidas já vem apimentados, então o meu plano para a comida seria passar os 15 longos dias comendo apenas biscoitos industrializados e tomando suplemento vitamínico. Sei que parece exagero, mas verão que não foi tanto assim. Lemos relatos de fontes confiáveis de que turistas morrem todos os anos por intoxicação alimentar aqui e pra coisa fica ainda mais crítica: Já foram descobertas falcatruas onde hospitais importantes (aqueles que os turistas procuram) pagavam restaurantes pra servir comida estragada para turistas e então ganhar depois pelos tratamentos. Devido à severidade de alguns casos, essas pessoas vinham à óbito. Animado pra comer na Índia?
Este é um país superpoluloso, com mais de 1 bilhão e 200 milhões de pessoas. Multi religioso, cheio de superstições, onde os casamentos ainda são arranjados e o índice de suicídio de mulheres recém casadas é altíssimo (foram cerca de 78 mil em 2010!). As mulheres são obrigadas a se casar muito cedo e geralmente com homens mais velhos (de 10 a 15 anos a mais). Essa diferença de idade ficou bem evidente enquanto estivemos no país.
Mas por mais que tenhamos tentado nos preparar "para o pior", a preparação nunca é suficiente quando se trata deste país.
A chegada.
Chegamos em uma cidade litorânea do leste, chamada Visakhapatnam. O motivo? Uma promoção de passagem aérea e tíckets com um preço ótimo saindo da Tailândia. A cidade não é turistica em nada, o que seria ótimo para sentirmos o país como ele realmente é. Com exceção de um alemão que conhecemos no aeroporto, fomos os únicos estrangeiros a vir naquele vôo com 'aromas da Índia'.
Já no caminho do Aeroporto para o hotel, passado da meia noite, andando de Tuc Tuc num preço superestimado, percebemos o que nos aguardava nos próximos dias. O que vimos: Muita sujeira e lixo pelas ruas. Não, não eram uns papéis de bala jogados na rua. Eram montes de lixo mesmo! E no meio das ruas ou do lixo, vacas, bois, carneiros e até porcos. Nem tente imaginar o cheiro, você não conseguirá sem estar aqui. Este lixo todo nas ruas é algo tão normal que as pessoas apenas desviam dele enquanto as vacas (animais sagrados por aqui) se alimentam.
Ao chegar no hotel, quase uma hora da manhã, fomos recepcionados por baratas em nosso quarto, sem contar no banheiro que acho que nunca foi limpo desde a inauguração do hotel, há uns 50 anos atrás. Era simplesmente nojento, mas tudo bem, depois descobriríamos que aquele hotel não era o pior do país.
No dia seguinte saímos pra conhecer a cidade e a praia que estávamos ansiosos por ver. No caminho, enquanto a Lisa tirava fotos do monte de lixo em frente a um hospital, um morador veio me perguntar por que ela estava tirando foto do lixo. Eu disse "isso é novidade pra gente, vamos guardar nas memórias da viagem"... Se mostrando incomodado, ele disse, "é pra mostrar pros amigos? Tem coisas mais bonitas pra tirar fotos". Eu agradeci a sugestão e seguimos rumo à praia. Ao chegarmos, pensa na muvuca! Milhares de indianos nas areias da praia. Todos de roupas normais (nada de biquinis) e muitos se banhando nas águas do mar de bengala que estava bem agitado naquele dia.
Outra cena bem normal é ver os homens urinando na rua. Ninguém passa aperto por lá! Vimos dezenas e dezenas de pessoas simplesmente parando seus carros pra dar uma "mijadinha". Certa hora me perguntei: "será que a polícia não faz nada quando vê alguem fazendo isso?" e então vi um carro de polícia parado e o policial fazendo exatamente o mesmo!
Queríamos sair daquele lugar e pra nossa sorte, conseguimos comprar para o mesmo dia uma passagem para o próximo destino, uma região de tribos bem no interior da mata. A compra da passagem foi uma outra maratona. Os atendentes simplesmente pareciam não querer nos atender e sempre nos mandavam "para o próximo guichê". Pior do que isso foi quando constatamos que os indianos simplesmente não respeitam o conceito de fila. Apesar das placas pedindo a organização em linha, eles simplesmente se amontoam na frente do guichê. Quando estava quase chegando a minha vez, mais um entrava pelo lado e assim ia até eu começar a dar cotoveladas pra chegar a minha vez! Ô stress!
Depois de quase um dia viajando de trem, chegamos ao nosso destino, onde conhecemos um hospital de olhos que presta tratamento gratuito aos moradores pobres das tribos da região. Este hospital recebe dezenas de pessoas todos os dias para cirurgias de cataratas e diversos outros problemas e funciona com doações. Foi bom passarmos uns dias isolados no meio da mata.
De lá, resolvemos ir à Calcutá, depois que uns alemães comentaram que a cidade teria bastante opções. Inicialmente, não tínhamos este plano, pois a cidade é uma das maiores do país e em cidades grandes é sempre mais difícil e cara a locomoção e hospedagem. A cidade até que não é tão suja como a primeira que visitamos e o metrô funciona bem. Foi lá que fomos em um cinema, assistir a um filme de Boliwood e foi muito legal, mesmo sem legendas! O povo vibra com o filme! Eu recomendo ter esta experiência se você estiver visitando o país! O problema nesta cidade foi a enchente que pegamos quando precisávamos ir para a estação de trem. Tinha chovido tanto desde o dia anterior, que as ruas estavam cheias de água.
Sim, foi na Índia que tivemos a primeira experiência de nossas vidas de caminharmos em ruas alagadas pela enchente. Justo neste lugar, onde o lixo se mistura com a paisagem. Esta foi até agora a experiência mais desagradável de toda a viagem. Assim que chegamos na estação de trem, fomos correndo nos lavar para tentar acabar com qualquer chance de doença.
Antes de falar sobre nosso próximo inesquecível destino, quero comentar sobre outra coisa que chama muito a atenção por aqui. Vimos muitos homens andando de mãos dadas ou abraçados como se fossem namorados. Isso chama muito a atenção, principalmente devido ao fato de ser proibido qualquer demonstração pública de afeto entre homens e mulheres. Os casais raramente andam de mãos dadas e nem nos filmes é possível ver uma cena de beijo entre um homem e uma mulher.
Os indianos tem um conceito de espaço privado bem diferente do nosso. Independentemente do lugar que você estiver, certamente alguém irá se encostar ou esbarrar em você. O que para nós incomoda pela proximidade, para eles é normal.
Espiritualidade
Nosso próximo destino foi Varanasi, a cidade sagrada dos hidús. Pra quem não sabe, esta é a cidade por onde passa o Rio Ganges, o ponto alto da viagem pra mim. Este rio é sagrado para os hindús e segundo a crença deles, quem é cremado neste rio vai direto para o "nirvana", sem outras reencarnações. Eles creem em algo como se o Rio viesse diretamente do céu.
Indianos se banhando no poluidíssimo Rio Ganges
Varanasi é uma das cidades mais antigas da humanidade, tem mais de 8000 anos. Encontramos ruas muito sujas e mais um lugar cheio de vacas pelas ruas. O trânsito é ensurdecedor, difícil de imaginar. Simplesmente não dá pra entender o por quê de eles buzinarem tanto!
O ponto alto desta cidade foi quando fomos assistir às cremações, que acontecem a céu aberto, à beira do Rio Ganges. Os corpos são trazidos em uma espécie de maca de bambú envolto em tecidos. O cortejo vem pelas vielas da cidade acompanhados de cânticos.
Somente os homens podem participar do evento, já que as mulheres choram e dessa forma não deixam o espírito da pessoa livre. Infelizmente não pudemos tirar fotos das cremações, então vou tentar explicar como isso ocorre.
Pilhas de lenha usadas nas cremações
Primeiro, o corpo é lavado no Ganges e depois colocado sobre uma pilha de madeira, como uma fogueira de São João. Os familiares então jogam uma espécie de serragem sobre o corpo e também o que chamam de gordura de vaca. Esta "manteiga" ajuda o corpo a pegar fogo mais facilmente e segundo eles, faz com que o cheiro não seja ruim. Quando o corpo está sobre a pilha de lenha, um membro da familha traz o fogo, que foi aceso em um templo próximo e após algumas cerimônias, o corpo é incendiado.
Cada cremação necessita de aproximadamente 300 kg de madeira, demora cerca de 3 horas e em cada local (chamado de Ghat) são cremados entre 100 e 150 corpos por dia. O mais curioso é que mesmo após as 3 horas, os corpos não queimam por inteiro. Pelo que li, o que sobra é uma parte da bacia e dos ombros, mas o que se vê é um "bolo" de carne preta cheirando a queimado, que é jogado no rio sagrado.
Algumas pessoas não são cremadas, como mulheres grávidas, crianças, pessoas "santas", pessoas picadas por cobras e doentes de hanseníase. Essas pessoas são simplesmente amarradas à pedras e jogadas no Rio. Segundo entendemos, a cremação serve como uma purificação e essas pessoas já estariam purificadas. Também nos contaram que as vezes os corpos se soltam das pedras e voltam à superfície tendo assim que ser novamente presas à pedras e afundadas. Algumas famílias pobres que não tem dinheiro para comprar madeira para a cremação, também simplesmente afundam seus familiares.
Para terminar as histórias de Varanasi, ficamos sabendo que mesmo com a poluição incrível do rio, ele é cheio de peixes (que tem comida farta nos corpos em decomposição no fundo do rio) e por isso, a culinária local é famosa por seus pratos a base de peixe. Nós não fizemos questão de provar!
A nossa próxima parada foi em Delhi, a capital. Uma megacidade, com seus 20 milhões de habitantes. Trânsito pesado, mas um sistema de metrô muito bom. Aqui foi onde constatamos a maior perda cultural dos indianos, relacioandos às roupas. Em lugares que visitamos mais ao sul e mesmo em Varanasi, as mulheres estavam na quase totalidade vestindo seus sarís e kurdis coloridos, mas em Delhi, a influência ocidental é maior e muitas mulheres já não usam mais as roupas tradicionais. Delhi foi talvez a cidade menos impactante para mim e foi onde passamos 3 dias em um Ashram, uma espécie de centro de meditação e Yoga. Estes centros (muito famosos no país), embora sejam ligados à religiões, recebem pessoas de todas as crenças para formarem instrutores de Yoga e meditação. Foram dias interessantes!
Além dos trens e metrôs que funcionam de uma forma muito boa, gostamos de descobrir que na Índia todos os produtos industrializados vem com uma incrição mostrando o preço máximo ao consumidor. Para nós, estrangeiros, isso foi ótimo, já que nos outros países da Ásia nós quase sempre pagávamos a mais em produtos sem o preço etiquetado! Não sei até que ponto isso é saudável para a economia, mas realmente gostei de não ser explorado aqui com os preços!
Cena pitoresca: sem-teto se banhando na rua
Conhecemos algumas pessoas na viagem que foram excelentes conosco e isso é o que levamos de bom de nossa viagem por aqui. Desconhecidos que cruzaram nosso caminho e nos mostraram um pouco mais dos costumes e cultura deste país! Valeu a experiência!
Incrível!!!!
ResponderExcluirComo somos pequenos perante as mais variadas culturas deste mundo!
Não fazia a menor ideia de como realmente é a Índia.
Sem falar que os indianos não respeitam a "fila indiana" rs.
Abraços
Muito bom! Só pra dizer, eu não perco uma publicação de vocês. Bjos!
ResponderExcluirNão experimentar os peixes depois daquele ovo... rsrs ... nem eu amiga!! nem eu!!!
ResponderExcluirO melhor de tudo é que viajamos junto com vocês e não precisamos provar as delícias que lhes são proporcionadas... rsrssr brincadeira... sei que isto é uma das partes difíceis da viagem, mas que são compensadas com outras milhares de coisas... mal posso esperar o próximo post, a curiosidade é grande... se cuidem e fiquem com Deus!!!!
ResponderExcluirImpressionante o rosto de vocês, como mudou para melhor. É de repensar a vida.Boa viagem. Abraços
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